terça-feira, 25 de junho de 2013

CPI DOS ÔNIBUS

(Editorial da Folha de S. Paulo desta terça-feira, 25 de junho de 2013)

Câmara Municipal debate hoje abertura de investigação sobre transportes públicos em São Paulo; setores do PT já trabalham contra comissão

Os vereadores de São Paulo terão hoje excelente oportunidade para dar uma primeira resposta às marchas que paralisaram a cidade. Basta que ponham em votação, e aprovem, a criação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para investigar o setor de transportes públicos da capital paulista.

O pedido para instalar a comissão foi protocolado pelo vereador Ricardo Young (PPS). Hoje, os líderes partidários na Câmara Municipal decidirão se a proposta entrará em pauta antes das que estão na fila há mais tempo. A depender do acordo, o plenário já poderá criar a CPI.

A ideia se tornou prioritária. Embora as manifestações tenham adquirido caráter eclético, elas começaram como um protesto contra o aumento de R$ 0,20 nas tarifas de ônibus e metrô.

Seria decepcionante, porém, se no plano municipal os protestos dos últimos dias se esgotassem na reversão do aumento (segundo o Datafolha, 66% dos paulistanos querem que as manifestações prossigam). A questão tarifária é só a primeira das pendências relativas às concessões de ônibus na cidade de São Paulo.

Reportagem desta Folha mostrou que o Ministério Público investiga uma situação "sui generis": o balanço de empresas de ônibus que operam na cidade apresenta prejuízo, mas seus proprietários fazem movimentações milionárias, algumas das quais consideradas atípicas pelo Coaf, órgão federal que apura lavagem de dinheiro.

Suspeita-se que os donos das companhias estejam envolvidos em desvio de recursos, troca de veículos novos por velhos e até venda de linhas de ônibus que não poderiam ser comercializadas, pois são uma concessão da prefeitura.

Talvez não seja coincidência que o Consórcio Leste 4, foco da averiguação, atue na zona leste paulistana, justamente onde é pior a qualidade do transporte público (informação da própria SPTrans, que gerencia as mais de 1.300 linhas de transporte de São Paulo).

Há ainda questões técnicas a serem elucidadas. Segundo o jornal "Valor Econômico", de 2006 a abril deste ano a receita média das empresas por passageiro cresceu 15% acima da inflação. Ainda que esse aumento decorra de cláusulas contratuais, seria oportuno esclarecer se foram feitos os investimentos previstos como contrapartida.

A Prefeitura de São Paulo, não é demais lembrar, fará no próximo mês licitação para selecionar novas empresas pelos próximos 15 anos. Estima-se que o negócio gire em torno de R$ 45 bilhões. É quase um truísmo cobrar maior controle sobre esse montante.

Como seria de esperar, o secretário municipal de Transportes, Jilmar Tatto (PT), investiu contra a CPI. Será lamentável se ele prevalecer, ou se, sob a influência de seu partido, a comissão entrar para o rol das que fazem muito barulho e nada esclarecem.

CPI é para achacar, diz secretário de Haddad


Jilmar Tatto (PT) afirma ser 'totalmente contra' comissão na Câmara para investigar transporte público municipal

Frase põe o secretário em rota de colisão com o presidente da Câmara paulistana, o também petista José Américo

(Folha de S. Paulo)

O secretário de Transportes de São Paulo, Jilmar Tatto, disse ontem que uma CPI na Câmara Municipal para investigar o sistema de transporte da cidade seria usada para achacar empresários.

"Sou totalmente contra, porque CPI, geralmente, quando se instala, é pra ficar achacando o setor, não é pra resolver, tirar dúvidas", disse Tatto, que é deputado federal licenciado pelo PT.

Há hoje na Casa dois pedidos de investigação sobre a área --um proposto por Ricardo Young (PPS) na última semana e outro de Paulo Frange (PTB), do início do ano.

Tatto afirmou ainda que não vê necessidade de uma CPI, pois, segundo ele, todas as informações do setor são enviadas à Câmara e a outros órgãos, como o Ministério Público. "Não tem caixa preta."

Para o secretário, é importante que a sociedade aproveite as manifestações pela redução das tarifas para debater a organização do sistema e até a lucratividade dos empresários, mas a criação de uma comissão iria "desviar o foco de como melhorar o sistema de transporte".

A Presidência da Câmara, comandada por José Américo (PT), rebateu a declaração do secretário do prefeito Fernando Haddad, também petista. Em nota, afirmou que as CPIs propostas estão fundamentadas em "princípios estritamente republicanos de transparência e zelo pelos recursos públicos". "Nenhuma comissão é criada com a intenção de prejudicar qualquer setor da sociedade."

Haddad já teve atritos com a bancada do PT na Câmara, após vetar, em maio, projetos de lei de vereadores da sigla.

Petistas procurados ontem pela Folha não quiseram comentar a fala de Tatto. A presidente municipal do partido, vereadora Juliana Cardoso, disse que precisava "ver o contexto" antes de falar.

Integrantes da oposição reagiram à fala de Tatto. Young insinuou que o petista atua a favor dos empresários do setor e quer convocá-lo para explicar a declaração, caso a CPI seja instalada.

"Não entendo o secretário dizer um absurdo desses. Ele está do lado de quem? Ele tem lado?", questionou. "Ele terá de se explicar."

Floriano Pesaro, líder do PSDB, ironizou a fala do petista. "Só posso lamentar que o secretário tenha essa visão de uma CPI, não sei se por experiência própria", afirmou.

O pedido de CPI protocolado por Young recebeu apoio de 23 vereadores, entre eles cinco petistas. Ele buscará hoje entendimento entre os líderes dos partidos na Câmara para que seja votada em plenário a criação de uma CPI em caráter excepcional --para isso são necessários votos de 28 dos 55 vereadores.

Líder do PT na Casa, o vereador Alfredinho diz que a assinatura de petistas no requerimento não significa que o partido votará pela abertura da investigação. Segundo ele, a Câmara precisa ter "cuidado" com CPIs criadas apenas com "intenção política".